Pais de bancada
Porque há quem escreva bem e pense o mesmo que eu, aqui fica um texto da espectacular Inês Teotónio Pereira.
Pais de bancada
ionline, 2013-12-07
Assim como existem treinadores de bancada, também existem os pais de bancada. Os pais de bancada são de todo o tipo e podem ou não ter filhos. O que os une nesta classe é a ideia clara e consistente que têm sobre a educação dos filhos dos outros. Eles sabem tudo. Da mesma forma que sabem como é que o Sporting podia chegar a campeão europeu com facilidade, também sabem como é que os filhos dos outros deviam ser educados. Os pais de bancada são a elite dos educadores. Eles olham para as crianças dos outros e para os outros com o mesmo desprezo e com a mesma arrogância moral com que os comunistas olham para essa mítica classe usurpadora e exploradora que é a burguesia. "Se esta criança fosse meu filho..." é a frase preferida dos pais de bancada. Pois eles sabem perfeitamente o que fazer com os nossos filhos para os tornar melhores filhos. Bastava uma semaninha ao cuidado deles e a criancinha transformava-se no Pequeno Lorde. Tipo receita da Bimby. Se há coisa que os pais de bancada não toleram são as birras. Birras das crianças dos outros é qualquer coisa que no país deles mereceria prisão perpétua. Birras em público, então, são um ultraje. Uma criança que se atire para o chão no meio de um supermercado porque quer empurrar o carrinho e a mãe não deixa, é uma situação que, no entender destes pais, revela um caso perdido de educação em que a culpa é só dos pais. Claro que a criança já é ruim por natureza, mas a verdade é que os pais não a sabem educar e a prova está ali, no meio do chão. Há duas leis sagradas para estes pais bancadas: a primeira é que as criancinhas são todas iguais e insuportáveis até prova em contrário e a segunda é que os pais são por natureza fracos e preguiçosos. E é com base nestas duas normas universais que eles estabelecem toda uma sólida teoria sobre educação, segundo a qual deve predominar a disciplina, seguindo-se a obediência, o respeito, a competência e a verdade. Assim como nos Comandos. E a verdade é que tal como no futebol, também aqui os pais de bancada têm quase sempre razão. É irritante, mas é verdade. É verdade que quando os nossos filhos vão a um restaurante e portam-se mal, a culpa é deles e é nossa porque os levamos lá. Por isso, merecemos o olhar gélido de todos os pais de bancada que partilham connosco todo um almoço infernal. Também é verdade que quando o nosso filho se atira para o chão de um supermercado humilhando toda uma família, devia apanhar duas palmadas bem dadas e ser arrastado por uma orelha até casa. E quem não faz isto, devia fazer. Quando os pais de bancada entram na escola, dá-se então a razia absoluta - nenhum pai fica de pé. Para os pais de bancada a culpa de tudo de mal que se passa com a vida escolar do nosso filho, é do nosso filho. Ora, esta forma de olhar para a vida escolar dos nossos filhos, não é, digamos, vulgar. Normalmente a culpa é dos professores, da turma, dos colegas, do currículo da Matemática, do sistema, enfim. Mas do nosso filho, raramente. Ora, os pais de bancada são infernais, é certo. São arrogantes e muito, muito irritantes. Principalmente porque têm razão. Assim como nós temos toda quando damos bitates sobre a educação dos filhos dos outros. No fundo, todos sabemos como o Sporting pode chegar a campeão. Teoricamente é possível.
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